quarta-feira, 30 de março de 2011

CRESCIMENTO ESPIRITUAL [Parte I]

II Pe 3:18

Introdução:

A vida resulta em crescimento. Vida espiritual resulta em crescimento espiritual. Ou, pelo menos deveria ser assim. Você está crescendo? Esteja certo de que Deus deseja que todo o crente atinja a maturidade espiritual. Sua Palavra nos ordena. "Antes, crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo..." (II Pedro 3:18). É esta a nossa obrigação e nosso privilégio. A cada dia, podemos progredir em nossa vida espiritual, prosseguindo num conhecimento mais pleno, mais alto, mais pessoal e experimental de Deus e de Cristo.

I.                   A NATUREZA DO CRESCIMENTO ESPIRITUAL

Há muitas ideias erradas quanto ao que envolve este assunto importantíssimo. É importante e fundamental se desejamos crescer espiritualmente desmitificar algumas concepções erradas, que caso compreendidas assim, prejudicarão o verdadeiro crescimento espiritual.

1.      Crescimento espiritual não é novo nascimento, mas decorre dele

 A regeneração [o novo nascimento] é uma ação da graça soberana de Deus no coração dando vida uma vez que sem Cristo o homem está morto. O morto precisa voltar a viver, para que depois cresça. Portanto, quando falamos de crescimento espiritual ele só pode ocorrer onde primeiramente houve o novo nascimento, não podemos crescer sem que primeiro haja novo nascimento. Aliás o novo nascimento é a condição indispensável para que haja crescimento espiritual. Não crescemos espiritualmente para sermos salvos [regenerados], fomos regenerados para que venhamos a crescer. O novo nascimento é a necessidade básica dos quem não está em Cristo; o crescimento espiritual é o desafio para aqueles que estão em Cristo. A necessidade do descrente é conversão; do que é crente é crescimento. Não podemos jogar futebol sem bola, não podemos crescer em Cristo, sem Cristo! Antes da planta crescer, ela tem que nascer. Se você está desejando conhecer e seguir a Cristo, a primeira coisa é converte-se! [Jo 3:3-7]

2.      O crescimento espiritual não é um ato, mas um processo [Mc 4:26-29]

Um crescimento espiritual grande geralmente não vem subitamente ou num período curto de tempo, embora isso aconteça algumas vezes. Uma semente na terra cresce em estágios: “Primeiro o talo, depois a espiga e, então, o grão cheio na espiga”. Assim acontece com o crescimento espiritual – uma pessoa não se torna imediatamente um “grão cheio na espiga”.  Algumas vezes Deus nos concede um crescimento espiritual tremendo dentro de um tempo muito curto, mas isso é a exceção e não a norma. Ao dizer que o crescimento espiritual é gradual, não estamos dizendo que ele deve ser lento, visto que o termo também se aplica ao crescimento rápido consistente. Mas estamos falando de um processo, seja lento ou rápido.

Ele não é algo brusco e repentino, não é mágico ou místico fruto de uma experiência. Alguns vivem correndo atrás de um culto, um livro, uma unção que possam instantaneamente transformá-los em crentes maduros, busca inútil. Pois não existe tal coisa.  Apesar de termos café instantâneo, macarrão,  métodos de emagrecimento instantâneo, não existe crescimento espiritual instantâneo. Um legume pode crescer algumas semanas, mas um carvalho amadurece mesmo depois de muitos anos de sol, chuva, vento e tempestade. Com qual dos dois você preferia que sua vida cristã se parecesse?

O crescimento espiritual passa por vários estágios até chegar a maturidade, os filhos de Deus não nascem perfeitos em fé, esperança, conhecimento e experiência. F. Shaeffer [A Verdadeira Espiritualidade] afirma que as duas coisas importantes na vida é nascer e crescer. O projeto de Deus não é só nos levar para a glória, mas nos transformar a semelhança de Cristo.

3. O crescimento espiritual não é acidental, mas intencional.[Fp 2:12-13

Crescimento espiritual não ocorrerá de uma forma automática, ou seja, muitas pessoas acreditam que após a conversão, o crescimento ocorrerá automaticamente, sem ser cultivado, desejado, provocado, planejado. Uma pessoa deve querer crescer, decidir crescer, esforçar-se por crescer.

A salvação é pura graça soberana, não é uma conquista realizada mediante obras, moralidade ou esforço, é um presente imerecido. Deus opera em nosso favor, sem qualquer participação humana; a obra da cruz é semelhante à mesa posta em um banquete; tudo foi feito e é oferecido de graça; basta aceitar e se servir. Contudo o crescimento espiritual envolve responsabilidade humana. "Desenvolvei a vossa salvação" — imperativo "esforçai-vos incessantemente para desenvolver a vossa salvação"; “operai” — denota esforço contínuo (1Co 15.10; Cl 1.29); não é ordem para incrédulos (não é ganhar a salvação), mas para crentes, para que se esforcem e sejam diligentes no viver santo (2 Co 7.1; Ef 4.1); não é "trabalhem pela salvação", mas "trabalhem na salvação" em direção à consumação da fé, em busca da santidade.

É responsabilidade do cristão mediante o esforço e a disciplina, seguir a Jesus, ser obediente à Palavra, exercitar os dons, viver de uma forma santa, temer a Deus. Devermos esforçar-se para produzir frutos, devemos almejar a santidade. O tempo verbal é o presente, denotando esforço contínuo, vigoroso e estremo. As figuras que ilustram a vida cristã são altamente dinâmicas somos comparados a um atleta [Fp 3:12] em uma corrida e a um soldado em meio a uma batalha contra a carne, o mundo e o diabo. [Ef 6, Rm 6]

Não devemos ser apáticos, licenciosos ou indiferentes respeito às coisas espirituais. 2 Timóteo 2:15 diz: “Procure apresentar-se a Deus aprovado, como obreiro que não tem do que se envergonhar e que maneja corretamente a palavra da verdade”. Em outras palavras, trabalhe duro para se apresentar aprovado a Deus por ser diligente em alcançar um conhecimento bíblico correto.  1 Timóteo 4:15: “Seja diligente nessas coisas; dedique-se inteiramente a elas, para que todos vejam o seu progresso”. Mas é preciso esclarecer que não significa um esforço carnal com vistas de uma exaltação pessoal, uma vã glória!

4.      Crescimento espiritual não é para alguns, mas para todos.

Alguns creem que maturidade ou crescimento espiritual é algo inalcançável, inatingível e somente uma casta pode obtê-lo. Maturidade é para os super-santos. A ideia é que para crescer espiritualmente eu tenho que orar 10 horas por dia, subir no monte, de preferencia as 2 da manhã, andar sobre as águas, morrer como mártir. É algo tão complicado que chega a ser desencorajador. Então a pessoa conclui, visto que ser maduro é isto, eu vou contentar em ser um crente de “segunda classe”. Não há mistério, não existe fórmula mágica. Crescimento consiste em cultivar um relacionamento centrado na Palavra, falarei mais sobre isto.

5.      O crescimento espiritual nada tem a ver com o favor de Deus. [Rm 5:6-10]

Deus não nos ama mais à medida em que nos tornamos mais espirituais. Às vezes os pais ameaçam seus filhos: "Se você fizer isso, Deus não vai mais gostar de você". Que ridículo! O amor de Deus não é condicionado ao nosso comportamento. Quando ainda éramos fracos, injustos, pecadores e inimigos (Romanos 5:6-10), Deus provou Seu amor por nós enviando-nos Seu Filho para morrer pelos nossos pecados. Deus não nos ama mais apenas porque crescemos. Ou seja, eu não desejo crescer tendo em vista merecer ou ser mais amado por Deus do que era antes. Deus não nos ama a partir de nossas obras, mas soberana e incondicionalmente. É exatamente a compreensão deste imerecido e incondicional amor de Deus por nós um poderoso e eficaz combustível para nosso desejo de crescimento espiritual.

6.      O crescimento espiritual nada tem a ver com o tempo. [Hb 5:11-12]

Não se mede crescimento espiritual pelo calendário. É possível uma pessoa ser cristã durante meio século e ainda permanecer um bebê espiritual. A revista Time fez uma reportagem sobre uma pesquisa realizada entre universitários que frequentaram a Escola Dominical durante muitos anos. De acordo com eles, Sodoma e Gomorra eram amantes, os Evangelhos foram escritos por Mateus, Marcos, Lutero e João; Eva foi criada de uma maçã, Jesus foi batizado por Moisés e Jezabel era a jumenta do rei Acaz. Talvez pessoas aposentadas respondessem de maneira ainda pior!

7.      O crescimento espiritual nada tem a ver com o conhecimento. [Tg 2:18, 3:13]

Uma pessoa pode conhecer muitos fatos, ter muitas informações, mas isso não é o mesmo que ter maturidade espiritual. A não ser que o conhecimento resulte na sua conformidade a Cristo, ele será inútil. Para ter valor, este conhecimento tem que transformar a vida. Não adiante tem informações e conteúdo bíblico e isto não transformar você. Conhecimento deve levar a transformação. Conhecimento e convicções são importantes mas não são substitutos ao caráter [integridade] e conduta. Nossa vida deve refletir nosso conhecimento. Se sua fé não muda você e não transforma você ela não vale muito. O conhecimento bíblico é uma medida, mas não é a única medida de crescimento espiritual. Conhecimento somente produz orgulho [I Co 8:10]

8.      O crescimento espiritual nada tem a ver com atividade.

Algumas pessoas pensam que crentes maduros são aqueles que estão sempre ocupados. Não necessariamente, é importante envolver-se no serviço e nas atividades da igreja, embora isto varia de acordo com a realidade de cada um. Mas a ocupação no trabalho da igreja não resulta em maturidade cristã, e nem a substitui. Pode até ser um obstáculo ao que é realmente vital e importante na vida do crente. No capítulo sete ãde Mateus, lemos sobre um grupo que clamará por aceitação da parte de Cristo baseado em obras maravilhosas. Mas Ele os lançará fora. Ocupação não resulta em salvação — menos ainda em maturidade. Ativismo não implica em crescimento [Lc 10:38-42 – Marta e Maria]

9.      O crescimento espiritual não é somente uma questão privada ou individual, mas comunitária e relacional

Vivemos a idolatria do individualismo e muitos vêm crescimento como uma atividade somente individual, não relacional. Mas esta visão não é bíblica, pois necessitamos de relacionamentos para crescer. Não crescemos isolados uns dos outros. Alguns pensam vou me isolar ficar longe de tudo e de todos, como um monge ou uma freira, enclausurado, isolado e fora do mundo real. Precisamos de vínculos [Hb 10:24-25]. Deus quer que cresçamos em família. É no corpo que pratico os imperativos cristãos [amar, servir, perdoar, orar], a comunhão não é opção, e um mandamento e uma necessidade. Aliás a qualidade do seu relacionamento com Cristo pode ser vista na qualidade com os outros irmãos. [I Jo 4:20]

10.  O crescimento espiritual nada tem a ver com prosperidade. [II Co 12:7-10]

Algumas pessoas dizem: "Veja só como Deus tem me abençoado. Tenho dinheiro, uma casa maravilhosa, um bom carro e um emprego seguro. Deus tem me abençoado porque eu O tenho honrado." Não acredite nisso. Deus pode ter permitido que você tivesse sucesso — ou até você mesmo pode ter forçado a situação — mas isso não é sinal de crescimento espiritual. 

Conclusão:

Minha definição de crescimento espiritual é: prática aliada a posição. Em Cristo sua posição é perfeita. E absoluta. E agora, Deus quer que você reflita essa posição numa experiência progressiva, que é relativa. Tal crescimento é essencial. Pode ser chamado pelo nome que quiser: seguir a justiça (I Timóteo 6:11); ser transformado (Romanos 12:2); aperfeiçoar a santidade (II Coríntios 7:1); prosseguir para o alvo (Filipenses 3:14); ou ser edificado e confirmado na fé (Colossenses 2:7). Este é o alvo de todo crente.



DISCIPLINA BÍBLICA NA IGREJA [Parte III]

I Co 5:1-13

Introdução


Deus ama a Igreja e deseja mantê-la saudável através da disciplina bíblica.

I.                   A NECESSIDADE DA DISCIPLINA NA IGREJA
II.                O PROPÓSITO DA DISCIPLINA NA IGREJA
III.             OS PASSOS DA DISCIPLINA NA IGREJA
IV.             UM EXEMPLO BÍBLICO DE DISCIPLINA NA IGREJA

IV.             UM EXEMPLO BÍBLICO DE DISCIPLINA NA IGREJA [I Co 5:1-13]

1.      A Natureza do Pecado Cometido

Infelizmente o pecado ocorre na igreja, não deveria, mas ele se manifesta. Não é negando a realidade de sua existência que resolvemos o problema. No versículo 1, ele diz: "...há entre vós imoralidade”. O pecado é sempre uma ofensa a um Deus Santo e Justo, seja ele qual for, no entanto alguns possuem dimensões e consequências diferenciadas. Este era o caso, este pecado...

A.    É grave

Este pecado é grave, aliás, é gravíssimo. Sua natureza é chocante a ponto de os próprios incrédulos chocarem-se diante de tamanho pecado. O pecado na igreja entra em choque com o seu caráter santo. Ou seja, por causa do que é a igreja, a manifestação do pecado no seio dela é algo que chocante. Um membro praticou um tipo de imoralidade altamente repugnante, vivendo incestuosamente com a mulher de seu pai [uma madrasta]. Logo este pecado...

B.     É escandaloso

Mesmo sendo a sociedade greco-romana marcada por uma tolerância moral, [incesto era condenado tanto pelo romanos como pelos judeus – Lv 18:7,8] mesmo que seus membros, antes de convertidos participassem e vivessem dissolutamente [I Co 6:9-11]. Não há possibilidade deles continuarem “depois de Cristo” a mesma vida que eles tinham “antes de Cristo”. Que tinha a vida de um lavado e regenerado com essas práticas do velho homem. No entanto outra dimensão deste pecado é que ele...

C.     É público
Muitos pecados atingem um estágio público e notório . Esse mesmo versículo 1 começa com as palavras: "Geralmente, se ouve que há entre vós...". A questão não era privada, de mais fácil resolução e aconselhamento, mas já se espalhara, chegando até ao conhecimento de Paulo, que se encontrava distante. Se a questão é pública deve ser tratado de forma pública. Era algo notório e se comentava; circulava rumores verdadeiros com respeito a este incidente.
2.      A Postura Errada da Igreja frente ao Pecado

A.    A igreja está omissa

Traz-nos constrangimento o fato de que a igreja de Corinto, como um todo, parecia não ver nada de grave nisso: E este homem continuava a viver com sua madrasta às vistas de toda a igreja! A igreja não via problema! Mas o que mais incomodava o apóstolo Paulo era a falta de uma atitude firme por parte da igreja com relação àquela pessoa.

Paulo não dirige sua palavra aos pastores ou líderes, mas a toda a igreja. Pecado é um problema de toda igreja. É uma questão que afeta todos os membros e que não é somente responsabilidade dos pastores ou diáconos olhar para a vida dos outros membros e tomar algum tipo de decisão, mas que é responsabilidade de cada membro do corpo de Cristo zelar para que haja pureza, santidade, que haja no convívio da comunidade, verdadeira santidade ao Senhor. É importante, portanto, que Paulo trata da questão dirigindo-se a toda comunidade.  A disciplina é um processo intracomunitário desenvolvido pelos membros, cada um participando e sendo responsável para que a vida da igreja ande corretamente. Se não for assim corremos o risco de sermos participantes dos pecados alheios e incorrermos na culpa de cumplicidade.

Devemos portanto cuidar de nós mesmos, e da santidade de nossa igreja. Não trata-se de uma atitude policialesca, mas em amor e por amor vivermos vidas santas e, de como comunidade, zelarmos para que o nome de Cristo seja honrado e glorificado através da vida santa da comunidade dos santos. Infelizmente entendemos piedade em termos individuais, ou seja, piedosa é a pessoa que se fecha no seu quarto para ler e orar gastando tempo a sós com Deus. E santidade seria algo que se desenvolveria individualmente. Piedade é algo que eu exerço junto com o povo de Deus; culto não é algo que eu presto individualmente a Deus, somente, mas algo que faço com meus irmãos. Santidade é algo comunitário. Nós crentes caminhamos a vida de santidade juntos. Perdemos de vista este aspecto corporativo da Igreja apresentado no NT. É tão importante, salutar, equilibrado e abençoador para cada um de nós a ideia de andarmos juntos, vivermos juntos e nos santificarmos com a ajuda uns dos outros.

B.     A Igreja Está Soberba

Paulo está angustiado pelo fato da igreja não tomar esta atitude para zelar pela vida e pela pureza da igreja, pelo nome de Cristo e pelo próprio pecador. A falta de ação revelava acomodação da consciência individual e coletiva ao pecado, em forma de rebeldia e soberba. No versículo 2, Paulo se espanta que aqueles irmãos "... não chegaram a lamentar" toda aquela demonstração de vida em pecado. Paulo diz ainda que eles se achavam "ensoberbecidos". Por que? A igreja estava ensoberbecida, envaidecida possivelmente por causa dos dons espirituais. Os membros estavam orgulhosos de constituírem uma igreja “carismática”, ou quem sabe, uma igreja que amava a todos do modo que eram e de como agiam, ou seja, se orgulhavam da postura tomada em vez de estarem conscientes do mal que era causado ao testemunho do Evangelho.

Ela assume uma postura oposta “festiva”, em vez de estarem lamentando, ninguém estava se preocupando com o problema. Paulo estava angustiado por ver um membro vivendo em pecado e por constatar uma igreja tolerante que convivia com o problema sem nenhuma dificuldade.

Quando a disciplina não é exercida, nossas consciências vão sendo cauterizadas e conformamo-nos ao modo de comportamento do mundo e, também, deixamos de nos chocar, de identificar o contraste com a forma de vida prescrita para o servo de Deus. O pecado é insano! E os efeitos colaterais deles terríveis! Tanto pessoalmente como coletivamente.

3.      A Natureza da Disciplina a ser Tomada [3-13]

A.    A sentença determinada: Exclusão do Membro [3-5]

Antes mesmo de dizer as razõeas, Paulo já vem com a solução para o problema. Paulo geralmente coloca o problema, introduz uma série de princípios doutrinários e no final apresenta a conclusão. Mas Paulo parece tão atribulado que apresenta o problema e logo dá a solução; só posteriormente fala sobre as doutrinas que estão por trás da questão. Isso, talvez pela angústia que lhe passava na alma em vista do grande amor que tinha por aquela igreja.

(1)   Uma ação pública, não privada

Ele fala como apóstolo de Jesus: “...já sentenciei...”. Ele usa das prerrogativas de apóstolo e como tal, ele sentencia. Esta palavra “sentenciar” vem da linguagem jurídica que significa o pronunciamento final de um processo de julgamento. A igreja deveria ter feito isso e por que não fez, Paulo toma para si as prerrogativas de juiz. Ele mesmo faz o julgamento, sentencia o membro infrator dizendo: “...que o autor de tal infâmia seja, em nome do Senhor Jesus, reunidos vós [uma ação pública, a disciplina é eclesiástica] e o meu espírito, com o poder de Jesus, nosso Senhor, entregue a Satanás para a destruição da carne, a fim de que o espírito seja salvo no dia do Senhor [Jesus]” (vs. 3-5).

Paulo aqui está ecoando o ensino de Cristo quando disse num contexto de disciplina: “Porque onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mt 18:20). Jesus já havia dito dois versículos atrás (v. 18) que: “...tudo o que ligardes na terra, terá sido ligado no céu, e tudo o que desligardes na terra, terá sido desligado no céu”. Paulo está ecoando o ensino de Jesus quando diz: [Eu, juntamente com vocês] “em nome do Senhor Jesus, reunidos vós e o meu espírito, com o poder de Jesus, nosso Senhor...” (v. 4). Dessa forma Paulo sentencia o membro daquela igreja.

(2)   Uma ação com consequências espirituais

O que significa “entregar a Satanás”? Em linhas gerais Paulo estava dizendo o seguinte: Uma vez que a pessoa não queira ouvir a voz da igreja, não aceita a repreensão do Espírito Santo, e,  sendo excluído da comunidade, será como uma ovelha que foi colocada para fora do aprisco. Lá fora estão os lobos à espera. Satanás vai cirandar, vai colocar sua mão em cima. O objetivo de Paulo com isso não é destruir a pessoa como muitos pensam em relação ao ato disciplinar. Em termos eclesiásticos alguns pensam de disciplina como algo que trás simplesmente punição ou destruição do pecador. Mas não é este o objetivo da disciplina. Apesar de todo rigor e firmeza de Paulo em tratar o assunto, ele diz: “...a fim de que o espírito seja salvo” (v. 5). Este é o objetivo que Paulo revela na sua carta; o amor por aquele pecador e seu desejo de recuperá-lo, mesmo que para isso medidas drásticas tenham de ser tomadas.

Se for o único meio, que assim seja excluído da igreja, ficando fora da proteção do Senhor e ficando exposto aos ataques do diabo. Ataques que são descritos no livro de Jó, quando este servo de Deus experimentou na carne a atividade satânica como doenças, aflições, perdas dos bens, etc. Em fim, toda sorte de aflições que com o decreto de Deus  Satanás às vezes pode infligir às pessoas para que o propósito de Deus seja feito. No caso, para este membro da igreja, o propósito era trazê-lo de volta ao seio da igreja através das aflições, angústias, dificuldades, e tribulações que Deus permitiria (decreto permissivo) que Satanás trouxesse a este membro em pecado. Ele deveria ser levado ao arrependimento, cair em si e voltar ao convívio da igreja.


B.     As Razões de Paulo Para a Disciplina Rígida

(1)   Porque o pecado é como o fermento (v. 6).

Se não cuidarmos ele se alastra e contamina toda a massa: “Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda?”. Paulo usa uma linguagem muito comum no VT. No VT uma das coisas usadas para tipificar o pecado é o fermento. Tanto é que na celebração da páscoa era proibido se comer pão com fermento (o pão era “asmo” – sem fermento). O fermento era símbolo do pecado.

Uma das propriedades do fermento pelas quais ele tornou-se símbolo do pecado, é sua capacidade de aumentar e dominar o ambiente onde se encontra. Se colocado um pouco de fermento no pão que está sendo preparado logo levedará toda a massa. O apóstolo diz que o pecado é exatamente assim. A idéia é que, se deixado sem correção, no seio da igreja, sem que as devidas soluções sejam tomadas, o pecado se propaga.

O que pensar dos jovens da igreja de Corinto? O que eles estavam aprendendo quando viam aquele homem vivendo com a madrasta e ninguém dava importância? O que eles estavam aprendendo? Aprendiam, que aquela atitude não faz diferença na vida cristã e que não importa nosso comportamento sexual. Podemos continuar em pecado e como um cristão normal. Era essa a mensagem que estava sendo passada para os membros da igreja; que o pecado realmente não importava porque a igreja parecia aceitar normalmente.

(2)   O segundo argumento de Paulo está baseado na Páscoa (também vem do Velho Testamento). Aqui no v. 7 Paulo se refere a Cristo como sendo nossa Páscoa e que ele já foi imolado por nós.

Paulo compara a vida da igreja a uma grande Páscoa, a uma eterna festa. O nosso Cordeiro Pascal já foi imolado e nós já nos alimentamos dele e se vivemos em uma eterna Páscoa, não deve haver fermento. Tem de ser lançado fora os fermentos, a massa velha. Por isso Paulo diz: “Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova massa...” (v.7). A Igreja é a comunidade Pascal liderada, salva e resgatada por aquele que é a nossa Páscoa. Na festa da Páscoa não podia se ter pão com fermento. Essa é a figura que Paulo usa. Se há pão fermentado já não é mais Páscoa. No v. 8 Paulo diz da vida cristã que “celebremos a festa, não com o velho fermento, nem com o fermento da maldade e da malícia; e, sim, com os asmos da sinceridade e da verdade”. É só quando a sinceridade e a verdade prevalecem que nós verdadeiramente celebramos. Somos uma comunidade que celebra, que vive na alegria, no gozo da santidade do nosso Cordeiro.

É claro que Paulo não está pregando o perfeccionismo. Mas alguns podem ter esta idéia; Paulo não está pedindo que a igreja seja perfeita, mas sim que a igreja de Corinto tome as atitudes certas quando o pecado aparecer. O pecado vai aparecer, é verdade, e pode ser em minha vida e na sua, mas que a comunidade ajude o pecador com interesse de auxiliá-lo. Não devemos ficar falando mal e criticando mas que tomemos as providências bíblicas para ajudar aquele que caiu vítima do pecado. Celebremos a festa com os “asmos” da sinceridade e da verdade.

(3)   Vemos um outro princípio nos versos 9-12. Há um momento para uma separação santa.

Infelizmente há momentos em que somente uma separação resolve. A separação da comunidade colocada aqui por Paulo é daquele membro impenitente que não deseja arrepender-se. Parece que Paulo coloca este ponto em destaque (ele gasta vários versículos nisso) provavelmente porque ele sente que foi mal compreendido. Paulo já havia escrito uma primeira carta aos coríntios. Essa primeira carta que conhecemos é, na verdade, uma segunda carta, porque Paulo já havia escrito uma carta antes que foi perdida. Paulo faz menção desta primeira carta perdida no v. 9. Nesta primeiríssima carta ele já havia falado da necessidade de separação, de não haver associação entre o cristão e a impureza. “Já em carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros”.

Aparentemente os coríntios haviam entendido que Paulo estava falando que os cristãos não deveriam ter qualquer contato com incrédulos. Por isso os coríntios concluíram que não haveria problema de ter associação com aquele irmão, mesmo que em gravíssimo pecado, visto que era “irmão”. Eles haviam pensado da primeira carta de Paulo que não deveriam se associar apenas com quem não fosse cristão. Paulo, então, corrige este equívoco e diz: “Já em carta vos escrevi que não vos associásseis com os impuros; refiro-me com isto não propriamente aos impuros deste mundo, ou aos avarentos, ou roubadores, ou idólatras; pois, neste caso teríeis de sair do mundo”. Paulo, aqui, está dizendo que não estava dizendo que não se associassem, ou mantivessem contato com este tipo de gente, com os pecadores deste mundo, porque, se assim fosse, teriam de sair do mundo. Paulo nunca sugeriu um gueto ou mosteiro, nem ao menos estava sugerindo que não convivessem com os não cristãos. O que Paulo diz é: “Mas agora vos escrevo que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento, ou idólatra ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com este tal nem ainda comais” (v.10). O que Paulo está dizendo é que não devemos nos associar com aquele que “dizendo-se irmão”, se fazendo passar por cristão, no meio da comunidade se comportem como não cristãos. A estes nem devemos convidar para uma refeição em nossas casas. Em outras palavras, há um momento em que é necessária uma separação clara e firme.

Paulo termina este terceiro princípio dizendo: “Pois com que direito haveria eu de julgar os de fora?” (5:12a).  Paulo está dizendo que não vai julgar os de fora que não são cristãos e que vivem em outro contexto. E então pergunta: “Não julgais vós os de dentro?” (v.12b). Paulo aqui deixa muito claro que julgar os “de dentro” é competência da igreja. Não vamos julgar os de fora, pois Deus os julgará. É isso que Paulo diz no versículo 13: “Os de fora, porém, Deus os julgará” (v.13a). Mas os de dentro sim; a comunidade julga os de dentro e toma as providências para recuperar o faltoso, o extraviado, para trazer de volta o que se desviou. E, se necessário for, para isso, a santa separação, que haja separação. Paulo conclui no v.13 dizendo: “Expulsai, pois, de entre vós o malfeitor”.





segunda-feira, 14 de março de 2011

DISCIPLINA BÍBLICA NA IGREJA

Continuação...

III. OS PASSOS DA DISCIPLINA ECLESIÁSTICA [Mt 18:15-20]

1.      Questões Preliminares e Importantes:

A.    É um pecado? [Se teu irmão pecar...]

De fato a questão é real, é fundamentada na Palavra como um pecado ou sou eu que estou imaginando, fantasiando, criando celeuma desnecessariamente. Avalie a realidade tendo em vista esclarecer, explicar, da direito de defesa pode ser simplesmente um mal entendido.  Há pessoas que são melindrosas e outras dadas a confusão e a intriga.

B.     É relevante? É grave?

É necessário? Mesmo sendo um pecado ele impõe um processo, sabendo que todo confronto é algo em si doloroso. Podemos relevar ou não? A Bíblia nos permite e até mesmo nos incentiva a relevar falhas menores, em vez de recorrermos à disciplina (Pv 10.12; 19.11; Rm 15.1; Fp 4.5; 1 Pe 4.8). O ofendido sente a necessidade de confrontar o ofensor. É bom para o ofensor ser confrontado? Considerações:

(1)   Falhas menores são atitudes e ações tais como aspereza, impaciência, murmuração, reclamação, negativismo, mesquinharia, ostentação, irritabilidade, falar demais ou falar em ocasiões impróprias, falta de confiança, ansiedade, falta de coragem, egoísmo, etc. Esses são pecados menores em comparação; porém, contrários às instruções bíblicas de que devemos ter consideração por outros, sendo pacientes, contentes, sempre agradecidos e alegres, prontos a perdoar, humildes, tardios para falar, tardios para nos irarmos, confiantes no Senhor, corajosos, abnegados, etc.

(2)    Caso uma falha menor seja considerada séria o bastante para tornar necessária uma abordagem pessoal, devemos ter um cuidado especial para levarmos em conta as palavras de Cristo sobre remover o “argueiro” no olho de nosso irmão, enquanto houver uma “trave” em nosso próprio olho (Mt 7.1-5).

(3)   É um comportamento repetido comum que esta desagradando as pessoas? Somente se uma falha menor se repetir frequentemente ou de modo tão perturbador, que cause dano à igreja, é que se deve tomar alguma medida que vá além de instrução, advertência e repreensão individual.

C.     É um pecado que pode ser confirmado?

Pecados que não podem ser confirmados são os que somente um membro tem conhecimento, além dos envolvidos na culpa. Além disso, são de uma natureza tal que se caracterizam como ofensas para as quais nada pode ser apresentado como prova. Por exemplo: insultos proferidos em particular, agressão física ou furto dos quais não se pode encontrar qualquer evidência física ou circunstancial; quebra de um trato verbal sem testemunhas,  conhecimento  pessoal do comportamento ilícito de um membro da igreja.

Em tais casos, pode ser necessário que a pessoa ofendida ou a única testemunha repreenda o culpado em particular. Contudo, se tal repreensão não for bem sucedida, e o indivíduo culpado não estiver disposto a admitir seu pecado aos demais, nada mais poderá ser feito pela igreja. O caso terá que ser entregue a Deus; não deve ser exposto a mais ninguém (Mt 18.16, cf. Dt 19.15; Pv 25.8-10). Deus é juiz e mesmo que a disciplina eclesiástica não o alcance [mediata] e divina e imediata o alcançará [I Co 11]
                                                                                                                           

2.      Ofensas de Natureza Pessoal

Ofensas de natureza pessoal são aquelas que acontecem entre dois crentes – mais especificamente, entre dois membros de uma mesma igreja. Ofensas pessoais podem ser definidas como “qualquer comportamento pecaminoso por parte de um membro que prejudique a outro”. Por exemplo: insultos, calúnia, violação de confiança ou trato pessoal, abuso físico ou sexual, adultério, agressão física, furto, vandalismo, etc. Em tais situações, a pessoa ofendida deve seguir as instruções de Mateus 18.15-17:

A.    Passo1: Abordagem Individual [Contato Pessoal, pessoa a pessoa]

A confrontação é uma tarefa cristã e dever ser feita. Não devemos esperar que a parte ofensora venha pedir perdão, se assim resolver-se-ia as ofensas pessoais mais rápido possível. Jesus ensina que o ofendido deve tomar a iniciativa para ter uma conversa com o ofensor. Como deve ser esta conversa?

(1)   Particular [entre ti e ele só]

Ele deve primeiramente procurar a pessoa culpada e, em uma conversa particular, explicar o motivo da ofensa, procurando levá-la ao arrependimento (Mt 18.15).   É uma ordem que implica em movimento [vai está no imperativo], logo se você não tem coragem de assim fazê-lo [o que é errado] deve então por um ponto final no assunto. Portanto ninguém precisa saber não há necessidade de espalhar ou divulgar o assunto com terceiros.
É significativa a palavra que Jesus “argui-lo” que significa instruir, corrigir, confrontar também pode ser traduzido como “trazer a luz, expor, esclarecer, estabelecer”.  É um termo usado para descrever o ministério do Espírito Santo [convencer - Jo 16:8] Assim antes do confronto é necessário pedir o auxílio do Espírito que possui este ministério de confrontação.

(2)   Em amor

Melhor é a repreensão franca do que o amor encoberto. Leais são as feridas feitas pelo que ama, porém os beijos de quem odeia são enganosos. [Pv 27:5-6]

Não aborrecerás teu irmão no teu íntimo; mas repreenderás o teu próximo e, por causa dele, não levarás sobre ti pecado. [Lv 19:17]

Há uma possibilidade real de resolvermos a questão em amor, “ganhaste a teu o irmão. Há um possibilidade real dele reconhecer seu erro e arrependido pedir perdão, restaurando o relacionamento, geralmente o relacionamento tende a ser fortalecido. Mas mesmo fazendo a abordagem individual e em amor Jesus não garante que teremos sucesso, ele pode não ouvir.

B.     Passo 2: Admoestação Testemunhal ou Privada

No caso de o ofensor não atender à confrontação individual, Jesus ordena que haja admoestação privada (v. 16). Jesus afirma que as outras pessoas envolvidas nesse processo serão testemunhas. O propósito delas não é a intimidação do ofensor porém, o de conscientizá-lo quanto aos prejuízos de sua atitude para com a comunidade do corpo de Cristo. Em outras palavras, nosso pecado traz consequências pessoais e coletivas.

(1)   Para tratar com objetividade e imparcialidade a situação

Isto é uma referência à prática vetero-testamentária de não se condenar alguém com base apenas em uma opinião pessoal (ver Nm 35.30, Dt 17.6 e 19.15). Com isto, a objetividade do caso é preservada, o que diminui as chances de injustiça, e o ofensor é beneficiado.

Por depoimento de duas ou três testemunhas, será morto o que houver de morrer; por depoimento de uma só testemunha, não morrerá. [Dt 17:6]

(2)   A natureza destas testemunhas

Serão testemunhas do problema ocorrido, ou testemunhas do contato que está sendo realizado? Creio que não são testemunhas do problema, pois se o fossem a questão já seria pública e não limitada às duas pessoas, como indica o v. 15. São pessoas que deverão testemunhar e participar do encaminhamento do processo de disciplina, da exortação, do aconselhamento, objetivando que o faltoso "ouça". Não são testemunhas silentes. O verso fala do "depoimento" delas.
(3)   Até onde vai este passo?

Quando é a hora certa de passar do passo 1 ao passo 2? Devemos pedir a Deus discernimento e sabedoria para ver quando não há mais progresso no contato individual e está caracterizado que a parte ofensora não "quer ouvir". O caráter sigiloso permanece.

C.     Passo 3: Pronunciamento Público na Igreja

O versículo 17 apresenta uma mudança enorme no encaminhamento da questão. O faltoso recusou a admoestação individual e a conjunta de dois ou três membros. Jesus, então, determina: "... se ele não os n atender, dize-o à igreja...". O "dizer à igreja", significa relatar à Assembléia. A continuidade da frase, neste mesmo versículo, mostra que o propósito de "dizer à igreja" continua sendo o da admoestação. Não é só uma questão de veicular notícias, mas a de visar a exortação do ofensor, que agora será feita "pela igreja". Infelizmente, muitos pecados públicos e já amplamente divulgados no seio da comunidade só são tratados a partir deste estágio. Muitas vezes aqueles mais próximos ao faltoso deixaram de aplicar os passos 1 e 2, ao primeiro sinal da ofensa. A igreja é, então, surpreendida com o pecado realizado, divulgado e comentado, restando aos oficiais apenas tomar o processo a partir deste passo. Humanamente falando, quem sabe pecados maiores não teriam sido evitados se a abordagem individual, prescrita por Jesus, tivesse sido realizada.
Tal proceder nunca é violação de segredos, pois o ofensor deliberadamente recusou os caminhos prévios do arrependimento. Diante de tal pronunciamento cada membro do corpo de Cristo deve orar pelo pecador, evitar comentários desnecessários (2 Ts 3.14-15) e vigiar a si próprio (1 Co 10.12).


D.    Passo 4: Exclusão Pública

O último recurso da disciplina é o da excomunhão, na qual o ofensor é privado de todos os benefícios da comunhão. Nesse caso, o ofensor é tido como gentio (a quem não era permitido entrar nos átrios sagrados do templo do Senhor) e publicano (que eram considerados traidores e apóstatas: Lc 19.2-10). Com estes não há mais comunhão cristã, pois deliberadamente recusam os princípios da vida cristã (1 Co 5.11).
A recusa no atendimento às admoestações, a atitude de arrogância e desafio às autoridades, retratada em 2 Pe 2.10-11 e Judas 7-8, devem levar o faltoso à exclusão da igreja visível. Somente evidências de arrependimento e conversão real poderão restaurar essa comunhão cortada pela disciplina. Com essa exclusão vão-se também os privilégios de membro, como a participação na Santa Ceia, e os demais.
Jesus demonstra a necessidade de respaldar essa drástica atitude na sua própria autoridade e na do Pai. Isso ele faz nos vs. 18-19, mostrando o seu acompanhamento e o do Pai, nas questões da igreja que envolvem a preservação de sua pureza. Ele fecha essas instruções com a promessa de sua presença na congregação do povo de Deus (v. 20). Essas são palavras de grande encorajamento para que a igreja não negligencie a aplicação do processo de disciplina em todos esses passos.
É claro que cada um desses passos envolve dor, tempo, amor e transparência. Nenhum deles é agradável e eles só prosseguem diante de dureza de coração do ofensor, ou seja, a recusa ao arrependimento. Há porém o conforto de saber que a presença e o poder de Jesus são reais mesmo no contexto desse processo (Mt 18.19-20). Assim, a disciplina eclesiástica "não é uma atividade a ser realizada facilmente, mas algo a ser conduzido na presença do Senhor."(12)

Conclusão:

Quero concluir com algumas implicações teológicas por parte do Pr. Valdeci da Silva:

A. Disciplina e a Adoração Cristã

A verdadeira adoração "é a mais nobre atividade de que o homem, pela graça de Deus, é capaz.".(13)  A exclusiva adoração a Deus é um mandato divino (Mt 4.10 e Ap 19.10), é uma marca da fé salvadora (Fp 3.3), e deve seguir os princípios revelados por Deus em sua Palavra.(14)  Um princípio essencial da adoração cristã é o zelo pela santidade do nome do Senhor (Ex 20.7 e Mt 6.9). A negligência do povo de Deus quanto aos mandamentos do Senhor motiva os incrédulos a blasfemar o nome de Deus (Rm 2.24). Assim, o zelo pela santidade do nome de Deus implica diretamente no exercício da disciplina eclesiástica. Uma igreja adoradora e ao mesmo tempo tolerante para com o pecado no seu seio é uma contradição de termos e recebe a repreensão do Senhor (Ap 2.18-29).

B. Disciplina e a Santidade

Sendo que Cristo deseja sua igreja "sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, porém santa e sem defeito" (Ef 5.27), a disciplina eclesiástica é altamente relevante, pois é um meio instituído por Deus para manter pura a sua igreja. O servo de Deus sempre deve almejar a pureza da noiva do Cordeiro (2 Co 11.1-3), mesmo diante da possibilidade da sua contaminação pelo mundo.

C. Disciplina e Evangelismo

A disciplina evidencia o amor cristão pelo pecador, ainda que esse pecador seja um dos membros da igreja. Esse amor pelo pecador cristão também reflete o amor da mesma pelo pecador incrédulo. A disciplina eclesiástica ressalta a seriedade do pecado. Sem a visão dessa seriedade, a igreja não é corretamente motivada a buscar a redenção do pecador. Há uma relação entre disciplina eclesiástica e evangelismo.
Uma igreja sem disciplina torna-se um impecilho para o avanço do evangelho. Essa relação vital entre evangelismo e disciplina é clara à luz de 1 Co 5.12-13. O evangelismo é dirigido aos que estão fora dos portões da igreja e que estão escravizados pelo pecado. A disciplina é dirigida àqueles que estão dentro dos portões da igreja e que estão se sujeitando ao domínio do pecado. Assim, ambos (evangelismo e disciplina) almejam a liberdade do pecador e a concretização do triunfo histórico da graça sobre o pecado na vida do mesmo (Rm. 6.1-23). Uma igreja sem disciplina proclama uma liberdade desconhecida, ou rejeitada, pelos seus próprios membros. Como diz Barnes, "há pouca vantagem em uma greja que tenta vencer o mundo se ela já tem se rendido ao mundo."(17) 

 Continua...